Apresentação
Espaço criado para divulgar ideias e materiais que incentivem a formação do leitor, através da motivação para a leitura e principalmente pelo contato e manipulação de obras literárias.
Somos estudantes do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Ouro Preto e, através deste espaço, buscamos divulgar, além da atividade final realizada na disciplina Ensino e Organização do Trabalho Pedagógico II, materiais que julgamos relevantes para o incentivo à formação de leitores. Neste sentido, destacamos como positiva a iniciativa da professora Márcia Ambrósio Rodrigues Rezende, que ao propor-nos uma atividade instigante e desafiadora, exigiu pesquisas, reflexões e construções. Desse modo, agradecemos a professora e as nossas tutoras Ana Leila, Sandra e Narita pelo apoio durante a realização da atividade.Como estudantes de Pedagogia, destacamos a importância da presença da Literatura no ambiente escolar, ressaltando que é papel do educador estimular o contato dos estudantes com obras que despertem a fantasia e promovam a reflexão acerca dos temas conflitantes que permeiam o cotidiano, como a construção da identidade e o respeito ao multiculturalismo.Também enfatizamos que a realização de projetos que incentivem o contato com obras literárias desde as séries iniciais da Educação Básica e principalmente a utilização da Literatura como fruição e apreciação estética pode contribuir decisivamente para a formação de leitores. Desse modo, apresentamos o projeto “Literatura Infantil: a arte de ler e encantar no espaço escolar”, como uma proposta para incentivar os estudantes a apreciarem a leitura pelo prazer de ler.
Sejam bem-vindos ao nosso espaço! Comentem, deixem sugestões...
O Cabelo de Lelê
Posted by Evanice in on 11/24/2012
Apreciação estética literária: possibilidades de uma educação para o respeito à diversidade
Justificativa
Conceber a diversidade como condição intrínseca da humanidade, não significa precisamente relacioná-la ao racismo e às desigualdades que geram conflitos e injustiças. Em um contexto social permeado por diferenças, a educação configura-se como importante e essencial espaço onde se desenvolve condições para o respeito e valorização da diversidade. Nesta perspectiva, a educação, como atividade humana e social, voltada para a humanização e o viver bem em sociedade, encontra delimitações políticas e culturais que, no decorrer da história, enfocou de diferentes maneiras a questão da diversidade humana, ora acentuando as diferenças, ora ignorando-as sob a justificativa de uma democracia racial.
A diversidade humana, embora seja atualmente considerado fator enriquecedor de culturas, esbarra na tênue linha que separa a mitificação da miscigenação da população brasileira e o racismo aberto e repugnante ainda presente nas escolas. Como processo essencial na formação de um indivíduo e fator corroborante no desenvolvimento da sociedade, a educação não encontra espaço para omitir-se ou permanecer estagnada diante do racismo escancarado e da falsa homogeneização racial, difundido pelo mito da democracia racial . Neste sentido, Martins e Gomes (2010) destacam que algumas ações já podem ser presenciadas na educação, inclusive através de políticas educacionais, como a lei 10.639/03 e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, muitas delas conquistadas através de movimentos sociais. Desse modo, as perspectivas para o ensino voltado para o respeito à diversidade deve ser uma preocupação cotidiana dos profissionais da educação, buscando apoio teórico e de materiais didáticos e paradidáticos, que segundo as autoras já estão recebendo uma reformulação a fim de atender a concretização de uma educação realmente democrática.
Como um meio de desenvolver a temática alusiva a formação para o respeito à diversidade, a obra literária como aprimoramento da sensibilidade estética pode configurar-se como importante aliado do professor, no sentido de oportunizar aos estudantes o contato com histórias que emocionam, divertem, sensibilizam e promovem a reflexão. Destarte, a educação escolar não pode omitir-se das suas responsabilidades de promoção da cidadania, priorizando a abertura de espaços onde se propicie a construção de cidadãos autônomos e conscientes de suas responsabilidades sociais, conforme orientam os estudos de Paulo Freire (1997). Como profissional da educação, o professor deve selecionar obras literárias que contribuam para a formação de leitores, explorando-as em seus amplos sentidos, de modo que o leitor tenha condições de desenvolver a apreciação estética e absorver as reflexões propostas pela obra.
Considerando o contexto histórico e social na qual a instituição escolar está inserida e concebendo a educação como um fator influenciado pelas práticas históricas e sociais, que por décadas inferiorizaram a cultura afro-brasileira, sobretudo a partir do ponto de vista europeu, é importante que a escola promova a construção da identidade positiva dos afrodescendentes, como a cor da pele e o cabelo os quais, de acordo com Gomes (s.d.), são fundamentais na construção da identidade negra, portanto, não podem ser encarados apenas como dados biológicos, já que possibilitam a construção social, cultural, política e ideológica da beleza negra, buscando uma ressignificação das características desses indivíduos. Segundo a autora, a escola é um importante espaço para a desconstrução dos fatores negativos relacionados ao cabelo crespo e, consequentemente abre-se uma oportunidade para a construção da identidade negra. Nesse sentido, a obra O Cabelo de Lelê (PNBE, 2008), citada por Martins e Gomes (2010), é um importante exemplar para oportunizar aos estudantes, o contato com uma história que enfoca a estética negra como um importante fator na construção da identidade, pois através da busca em “dar um jeito no cabelo crespo”, Lelê mergulha na história dos países africanos e passa a contextualizar sua aparência, valorizando suas características.
Desse modo, a proposta de atividade de leitura da obra O Cabelo de Lelê, é uma oportunidade de proporcionar aos estudantes o contato com uma literatura infantil, que encanta pela harmonia do seu texto, muitas vezes com rimas, diverte o leitor com as ilustrações e pode sensibilizar, despertando a senso estético e contribuindo para a construção de uma identidade positiva da beleza negra.
Sugestão de público
Esta atividade tem como público alvo, estudantes do primeiro ano do ensino fundamental.
Objetivos
• Oportunizar aos estudantes o contato, apreciação e manipulação de uma obra literária;
• Despertar o gosto pela leitura, vislumbrando a obra literária em seu sentido estético, a fim de contribuir para a formação de leitores;
• Propiciar um momento de reflexão acerca da estratégia utilizada pela personagem Lelê em busca de resolver um conflito pessoal;
• Utilizar a apreciação estética literária para contribuir com a construção positiva da identidade dos estudantes afrodescendentes, além de estimular a construção do respeito à diversidade e da autoestima.
Material didático
Diversos exemplares da obra: O Cabelo de Lelê
Painel com a ilustração representativa da personagem Lelê
Cachinhos de E.V.A. preto , lã colorida, macarrão parafuso, lacinhos, fitas e outros acessórios para o cabelo.
Desenvolvimento
Organizar a roda da leitura, com os alunos dispostos em círculos e sentados no chão, permitindo que todos tenham acesso ao livro que será lido. Esse momento é importante, pois se pretende não a penas contar uma história, mas oportunizar o contato e a manipulação de uma obra literária, sorvendo-a em seus mínimos detalhes, como capa, contracapa, ilustrações, formatos das letras, enfim, buscar despertar todos os sentidos possíveis com a manipulação da obra. Desse modo, é importante que o professor leve vários exemplares, a fim de dinamizar a atividade, entretanto, caso não seja possível, o educador não deve considerar o fato como empecilho para a realização da atividade, mas promover as possíveis adaptações.
Após o momento de contato/manipulação do livro, o professor inicia a leitura da história, sempre com eloquência, para que os estudantes possam mergulhar e sentir toda a atmosfera de encantamento produzida pela obra. É importante ressaltar que se trata de uma leitura expressiva e não de uma contagem de história, uma vez que se busca com a atividade, promover a formação de leitores literários.
Após a leitura será aberto um espaço para que todos possam expressar suas reações perante a história, sendo necessário, nesse momento que o professor oriente a discussão no sentido de oportunizar aos estudantes uma reflexão que contribua para a construção da identidade dos estudantes, relacionando as características físicas aos fatores como a descendência, por exemplo, aproveitando o momento para aprofundar a discussão acerca da história lida.
Como estratégia para ressaltar a construção positiva da identidade, o educador pode retomar trechos do livro, como o início, onde a personagem Lelê afirma não gostar “do que vê” e a transformação que a personagem apresenta após entender as suas raízes e ter contato com a historiografia africana. No trecho, “De onde vêm tantos cachinhos?, pergunta, sem saber o que fazer/ Joga pra lá, puxa pra cá/ Jeito não dá, jeito não tem./ De onde vêm tantos cachinhos, a pergunta se mantém”, a autora instiga a busca da construção da identidade e ao relatar que “Depois do Atlântico, a África chama/ E conta uma trama de sonhos e medo/ De guerras e vidas e mortes no enredo/ também de amor no enrolado cabelo/ Puxado, armado, crescido, enfeitado/ Torcido, virado, batido, rodado/ São tantos cabelos, tão lindos, tão belos!”, há uma oportunidade de fortalecer a ressignificação das características étnicas dos estudantes afrodescendentes, bem como propiciar a valorização da diversidade.
A transformação da personagem durante a história, apresentada pela narrativa ritmada deve ser aproveitada pelo professor, enfatizando trechos onde os alunos possam compreender que a mudança da personagem ocorre em virtude da aceitação de sua própria imagem, o que ocorre a partir do momento em que conhece a cultura de seus descendentes: O cabelo de Lelê” apresenta; “Lelê gosta do que vê!/ Vai à vida, vai ao vento/ Brinca e solta o sentimento/ Descobre a beleza de ser como é/ Herança trocada no ventre da raça/ Do pai, do avô, de além-mar até”. O livro aborda ainda o aspecto da aceitação e respeito do outro: “O negro cabelo é pura magia/ Encanta o menino e a quem se avizinha”. E finaliza dizendo: “Lelê já sabe que em cada cachinho/ Existe um pedaço de sua história/ Que gira e roda no fuso da terra/ De tantos cabelos que são a memória/ Lelê ama o que vê! E você?
O final da história mostra que todos podem buscar a sua identidade e incentiva a construção da autoestima através da aceitação das próprias características, além do reconhecimento e aceitação do outro, fatores tão importantes nessa faixa etária, onde a identidade está se formando.
Finalização da atividade
Para finalizar a atividade, será proposta a representação da personagem Lelê em um painel, inspirada nas páginas 16 e 17, que trazem Lelê com diferentes penteados. Todos os alunos terão a oportunidade de contribuir com a construção do cabelo, utilizando diversos materiais e acessórios.
Dando continuidade a temática, a professora apresentará outros títulos que ficarão disponíveis no cantinho da leitura, para que os estudantes possam levar para casa, sendo sugerido As tranças de Bintou de Sylviane A. Diouf e ilustraçãode Shane W. Evans. E Menina Bonita do laço de fita, de Ana Maria Machado, publicado pela editora Ática.
Considerações finais
A literatura infantil em sua apreciação estética propicia aos estudantes a oportunidade de se encantarem com as histórias e ao mesmo tempo refletirem sobre questões que estão presentes em seu cotidiano, como a discussão acerca da construção positiva da identidade e autoestima. Nesse sentido, a obra literária O cabelo de Lelê é um importante exemplo de como encantar pelo prisma da fantasia, possibilitando aos educandos uma oportunidade de desenvolverem seu senso crítico perante fatores como a estética e sua relação com a construção da identidade e aceitação das diferenças.
Referências bibliográficas:
BRASIL. Lei n. 10.639, de 09/01/2003. “Altera a Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática ‘História e Cultura Afro-Brasileira’ e dá outras providências”. Conferir Revista Afro-UFU – Março 2006. Edição Única.
GOMES, Nilma Lino. Corpo e cabelo como símbolos da identidade negra. Disponível em < http://www.rizoma.ufsc.br/pdfs/641-of1-st1.pdf> Acesso em 22 de abril de 2012.
GOMES, Nilma Lino. Educação, identidade negra e formação de professores/as: um olhar sobre o corpo negro e o cabelo crespo. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.29, n.1, p. 167-182, jan./jun. 2003.
MARTINS, Aracy Alves. GOMES, Nilma Lino. Literatura infantil/juvenil e diversidade: a produção literária atual. Literatura: ensino fundamental. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010. 204 p. (Coleção Explorando o Ensino; v. 20)
OLIVEIRA, Ana Arlinda de. O professor como mediador de leituras literárias. Literatura: ensino fundamental. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010. 204 p. (Coleção Explorando o Ensino; v. 20)
Livros literários
BELÉM, Valéria. O cabelo de Lelê. Ilustr.: Adriana Mendonça. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007.
DIOUF, Sylviane A. As tranças de Bintou. Trad. Charles Cosac. Ilustrações Shane W. Evans. São Paulo: Cosac Naify, 2004
MACHADO, Ana Maria. Menina bonita do laço de fita. Ática - 7 º Edição - 2000 24 p.